Barragem do João Leite em Goiás

Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB) divulga manifesto em defesa da atuação governamental para viabilizar reservatórios de água no Brasil. Entidade publicou a carta de São Paulo, 23 de maio de 2018, em evento técnico de barragens.

Há quase 60 anos, o Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB) apoia e subsidia a utilização responsável dos recursos hídricos nacionais.

Fornecimento perene de água e alimentos é preocupação constante e, como esses são sazonais, pouco uniformes no tempo, estocamos na abundância para utilizarmos na carência.

Os reservatórios são evolução natural desse aspecto, reserva de segurança para a manutenção da vida pelo fornecimento contínuo de água. A espécie humana convive com barragens desde o início da civilização e passou a utilizar o aumento do desnível de água armazenado em rodas d´água, evoluindo daí formas de gerar energia.

A disponibilidade de água e energia permite que existam conglomerados humanos com milhões de indivíduos. Crescimento e concentração populacional são afetados pela desigualdade de acesso da maioria das pessoas a insumos básicos: água tratada, acesso à energia, mobilidade e moradia, condições mínimas de higiene e conforto.

Além das regiões metropolitanas, o País possui áreas com clima seco que devem ser atendidas pelo aumento da reservação, criando condições de sobrevivência aos atingidos pelas secas constantes. Essas regiões se adequam à vida humana digna, desde que atendidas por empreendimentos e gestão adequada de recursos hídricos.

Hoje, 50% dos alimentos utilizados dependem de irrigação: empreendimentos hídricos, sua expansão, manutenção e proteção contra efeitos de mudanças climáticas são preconizados nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU.

O Brasil sempre foi um País responsável e inovador na área de recursos hídricos. Domina toda a tecnologia e fases para o desenvolvimento de empreendimentos hidráulicos com parque industrial consolidado.

A falta de discussão, alguma desinformação e limites de investimento aumentaram o risco hídrico, gerando um sistema cada vez mais hidrotérmico. A falta de recursos coloca hoje a indústria e a construção nacionais em risco, podendo emigrar do Brasil, aumentando importação de tecnologia, equipamentos e combustíveis, expostos ao custo das variações cambiais.

O ciclo natural da água gerado pela energia da insolação e gravidade, utilizado com os devidos cuidados em usina hidrelétrica produz energia limpa, renovável, com impacto extremamente baixo na produção de gases do efeito estufa.

A energia das hidrelétricas provém exclusivamente da água, ao contrário de termelétricas, majoritariamente utilizadas em países desenvolvidos que, após exaurirem recursos hidrelétricos, geram preponderantemente a partir de combustíveis fósseis ou materiais radioativos.

O Brasil tem recursos hídricos abundantes, com distribuição heterogênea em bacias hidrográficas, com condições hidrológicas diversas, que geraram um sistema elétrico único no mundo: é interligado, cobre o País, permite levar a energia de uma região a outra, otimizando o sistema, aumentando a disponibilidade e a confiança nele.

Há décadas, o País posterga investimentos importantes na área de recursos hídricos e construção de reservatórios, gerando o panorama atual de água superficial poluída, sistema elétrico dimensionado em condição crítica de fornecimento e carência de água em regiões urbanas importantes.

Abriu mão da reservação de água na maior parte dos empreendimentos, optando por usinas denominadas de fio d’água, que geram energia através da água que chega a cada instante no empreendimento, sem regularizar o curso d’água, usando desníveis mínimos para a produção de energia. Apesar de viáveis economicamente, inunda-se, ainda, área considerável sem o armazenamento que equivaleria à reserva que manteria o sistema seguro. Essa falta causa a necessidade de complementação por energia térmica, com impactos econômicos, sociais e ambientais.

Acreditamos que diversificar a matriz elétrica é fundamental e deve-se buscar soluções sustentáveis. É essencial que a geração eólica e solar tenha recebido estímulos para se inserir e se afirmar como fontes importantes. Entretanto, são intermitentes, necessitam do sistema interligado de armazenamento e fontes de estabilidade.

Esse importante papel de estabilizar o sistema sempre foi hidráulico, mas com a falta de novos reservatórios, a energia térmica assumiu progressivamente este papel, aumentando custos e o efeito estufa, causando desequilíbrios ao setor, em detrimento da opção hidráulica, mais econômica. Ao contrário das concorrentes, sua maturação é longa e sua implantação necessita de tempo expressivo para materialização, e há dificuldade para a geração hidráulica – renovável, limpa e econômica – viabilizar-se no mercado, em razão dos incentivos fiscais e regulatórios oferecidos às outras fontes.

Conclamamos a sociedade civil e agentes do setor para a análise da situação e o planejamento de soluções baseados em fatores técnicos frente ao risco hídrico existente. Insistimos na avaliação criteriosa e isenta da matriz energética com especial atenção à preservação da tecnologia dominada pelo País, manutenção adequada e desenvolvimento do parque hidráulico existente.

A união dos atores nacionais na discussão corajosa dessa situação é necessária e nos colocamos como entidade técnica, neutra, sem fins lucrativos à disposição para colaborar nesse diálogo. Não podemos limitar ou abrir mão da vantagem competitiva do Brasil, com recursos hídricos abundantes, que deve ser utilizada para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros, preservando recursos naturais e caminhando em direção a uma economia sustentável.

Por essas razões, O CBDB preconiza a equalização dos estímulos oferecidos às diversas fontes de geração de energia em benefício do crescimento ordenado e sustentável. Entende que é prioritário restaurar e aumentar a garantia de água e energia com a criação de novos reservatórios que as armazenem.

O CBDB apoia as agências reguladoras que salvaguardam o fornecimento seguro no País. Defende a razoabilidade do estudo e a ampliação de reservatórios sob a ótica sustentável e energia limpa dela decorrente, ajudando a controlar os efeitos das mudanças climáticas, pois reservatórios, além de fornecer água, energia e seus usos múltiplos, controlam cheias, amenizam efeitos de secas, geram lazer e elevam qualidade de vida. A segurança hídrica é fundamental, ligada à vida e à dignidade.

Emblematicamente, o CBDB se manifesta neste evento em São Paulo, cuja população sofreu período importante de limitação no fornecimento de água e passou por riscos significativos. Esse exemplo demonstra que obras hidráulicas são necessárias no Brasil como um todo, antecipando a visão das mudanças demonstradas pelo último relatório do International Panel on Climate Change, ligado à ONU.

Após debates ocorridos no XI Simpósio sobre Pequenas e Médias Centrais Hidrelétricas, no II Simpósio sobre Usinas Hidrelétricas Reversíveis e no II Encontro Técnico sobre Incidentes e Acidentes em Barragens, as entidades, associações, empresas e os profissionais especialistas do setor elétrico reunidos na cidade de São Paulo, Capital, vêm solicitar ações governamentais com vistas à viabilização dos empreendimentos hidráulicos com reservatórios de acumulação no Brasil.

No aguardo de providências, assinam:

Eng.° Carlos Henrique Medeiros – Presidente do CBDB

Eng.° José Marques Filho – Vice Presidente do CBDB

Fonte: Comitê Brasileiro de Barragens, publicado em 23/05/2018.

Foto: Reservatório do Ribeirão João Leite, em Goiânia/GO, armazena 130 bilhões de litros de água – construído e operado pela concessionária pública Saneago.