As crotalárias não têm eficácia comprovada para combater o Aedes Aegypti, mosquito transmissor da dengue.
Pesquisadores do Instituto Agronômico de Campinhas, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios – APTA, publicaram cartilha para alertar sobre a população sobre falsas informações de eficácia das crotalárias.
Não existe comprovação científica da eficácia dessa planta como alternativa de controle do mosquito transmissor dessa doença.
Artigo científico – vários autores
O aumento dos casos de dengue no País e a ameaça do zika vírus fazem com que os brasileiros busquem por soluções caseiras para afastar o mosquito transmissor e complementar o combate aos criadouros. Uma dessas ações é o plantio da crotalária, planta com flores amarelas, algumas com detalhes vermelhos, que atrai a libélula, predadora natural do Aedes aegypti, assim como de suas larvas.
Cidades de diversos estados do País distribuíram sementes no ano passado, porém ainda não há comprovação científica que mostre a eficácia da ação. Em Campinas, SP, aumentou a procura em lojas especializadas para adquirir sementes.
Em uma delas, a venda desse produto aumentou 50% nos últimos dois meses. De acordo com os funcionários da empresa, eles passaram a separar as leguminosas em saquinhos menores, de 1kg, que são vendidos a R$ 10,00 cada.
“Nessa quantidade, é possível plantar em uma extensão de 500 metros de terra e produzir cerca de 100 mudas”, conta Aracelli Cristina Gomes, de 18 anos, auxiliar de escritório da distribuidora Sementes Fortaleza.
Lucas Tessarini, de 30 anos, administrador da firma, contou que um dos clientes gostou do resultado na área rural de Monte Mor. “Ele me disse que a planta espantou os pernilongos depois que cultivou na chácara dele. Mas não dá para saber se foi por conta das flores, só sei que ficou satisfeito”, descreveu.
Ausência de comprovação científica
A comunidade de especialistas afirma que não há fundamento científico para esta medida caseira. Para Edmilson Ambrosano, pesquisador da APTA. na Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, é preciso cuidado para tratar essas ações, pois o combate ao Aedes é problema de saúde pública.
O especialista é autor, com outros quatro pesquisadores da área, do documento do Instituto Gastronômico de Campinas (IAC) “Aedes Aegypti: Controle pelas crotalárias não tem comprovação científica”, lançado no ano passado.
O objetivo é alertar a população sobre a ausência de validação científica do cultivo de espécies de crotalária, particularmente juncea e spectabilis, como alternativa para controle do Aedes. O único procedimento eficaz ainda é a localização e a eliminação dos focos do vetor.
Em relação ao combate do Aedes, Ambrosano esclarece que seriam necessárias milhões de libélulas para combater apenas algumas larvas do mosquito. Além disso, ela é predadora inespecífica, ou seja, não preda preferencialmente as larvas do Aedes . Também é raro que as libélulas sejam constatadas em locais onde também é comum o mosquito da dengue. “Além disso, a libélula faz a postura de seus ovos em grandes depósitos de água, enquanto o mosquito precisa apenas de uma gota de água.”
A cartilha alerta que a utilização dos carros de fumacê, ou qualquer outro aparato para pulverizar inseticida em áreas urbanas, têm pouco ou nenhum efeito sobre o mosquito. O documento também alerta que não é aconselhável o uso contínuo de produtos químicos, como repelentes, em sucessivas aplicações, pois podem ocorrer problemas na pele ou graves intoxicações, principalmente em crianças.
Os autores também reforçam no documento que a divulgação dessa informação é alarmante e irresponsável porque, além da semeadura em praças e farta distribuição de vasinhos com mudas de crotalária, como ações de alguns políticos e de prefeituras do interior dos estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul. Foram propostos muitos projetos de lei de âmbito municipal – alguns vetados e outros, preocupantemente já aprovados – para incentivo ao cultivo de crotalárias (geralmente de C. Juncea), bem como de citronela. Essas ações e propostas são baseadas em justificativas no mínimo, não adequadas, particularmente no quesito comprovação científica.
A grande dificuldade em responder à epidemia é que muito pouco se sabe sobre o zika, que praticamente não existia no País até o ano passado. Para montar a estratégia eficiente de combate, os cientistas precisam entender melhor como ele funciona, seu ciclo na natureza, como interage com o mosquito Aedes Aegypti e seu comportamento no organismo humano.
Ambrosano esclarece que a crotalária é uma leguminosa muito eficiente para o enriquecimento do solo, pois tem a capacidade de produzir nitrogênio, adubo verde essencial para o cultivo agrícola.
A espécie está sendo bastante procurada como alternativa para a rotatividade nas plantações de cana-de-açúcar. “Com o aumento do álcool nesses últimos meses, os produtores querem utilizar a planta para enriquecer o solo e intensificar as próximas colheitas e a produção do etanol no Brasil”, destaca.
Fonte: Correio Popular, Campinas – Agência Anhanguera, autora Camila Ferreira – publicado em 08/01/2016.